A surpreendente alta do IGP-M gerou insegurança em locadores e locatários. O índice que é referência para reajuste de aluguéis foi reajustado em mais de 23%, impactando diretamente contratos de locação. 

Em 2020, o cenário de incertezas provocado pela pandemia levou locatários e locadores a renegociar valores cobrados pelo aluguel de seus imóveis. A maioria das empresas passaram por grande imprevisibilidade financeira e redução de faturamento. Em função disso, muitos inquilinos deixaram ou limitaram sua capacidade de pagar os aluguéis e muitos locadores concederam descontos.  

Naquele momento, as negociações para redução dos valores de aluguéis possibilitaram que o locatário pudesse manter seu imóvel alugado, respeitando também o direito de propriedade – o direito do locador que tem como fonte de subsistência os valores que recebe daquela locação. Ambas as partes foram afetadas e precisaram dividir os prejuízos inerentes a essa realidade.  

No entanto, a crise que trouxe dificuldades para muitos, também ofereceu oportunidades para alguns. Há empresas que aumentaram lucro durante a pandemia, com seus produtos e serviços mais demandados. 

Observar se o inquilino faz jus ou não à algum tipo de renegociação de contrato é o primeiro passo para determinar o reajuste de aluguel em 2021. Se a atividade econômica do inquilino não foi seriamente afetada pela crise, pode ser que não seja necessário que o locador o exima de pagar seus encargos, suas obrigações. Porém, se o locador reconhece a necessidade do locatário, é possível negociar alguma ajuda, deixando claro que também o dono do imóvel vem sofrendo com as repercussões da pandemia. 

Por outro lado, o inquilino que estava em um nicho de mercado privilegiado – como alguns ramos de gêneros alimentícios, hospitalares e da medicina em geral – pode ter que provar que a pandemia afetou de forma negativa ou positiva seu orçamento, de forma a justificar ou não algum tipo de benefício. 

Como calcular o reajuste do contrato de aluguel frente à alta do IGP-M? 

Na história do Real não existe um reajuste tão alto quanto o que está ocorrendo agora com o IGP-M. Por outro lado, o IPCA tinha um reajuste muito menor. Mas o índice usado pra os reajustes dos contratos de locação, em mais de 90% dos casos, é o IGP-M. 

Frente a realidade do IPCA, do IGP-M e a dificuldade de inquilinos pagarem o aluguel, e muitas vezes já com descontos concedidos pelos locadores em função da crise do coronavírus, houve um novo debate sobre a decisão se aquele IGP-M deveria ser aplicado ou não. Nesse debate, a princípio, pensou-se que não seria uma situação que se sustentasse, inclusive inviabilizando contratos.  

Muitos contratos foram renegociados com o IGP-M menor, porém, apesar dessas renegociações, toda a sociedade continuou sentindo impactos: produtos alimentícios e outros bens de consumo também foram reajustados. Com isso, não parece ser justo que o locador forneça descontos para os inquilinos e continue sendo afetado pela pandemia da mesma forma, sendo que os inquilinos, em certos casos, não foram tão afetados assim. 

O que os locadores e locatários devem fazer frente a essa nova realidade do IGP-M? 

Avaliar se a relação é sustentável para ambas as partes é o primeiro passo para uma negociação saudável e equilibrada. Talvez os locatários precisem de imóveis em outros lugares ou com outros valores que se encaixem em sua realidade atual. E os locadores precisam avaliar se a relação é sustentável, analisar o consentimento de descontos. 

Hoje, a manutenção de descontos ou a concessão de redução no índice de reajuste contratual deve ser mais aprofundada pra demonstrar de fato que cabe aquele desconto ou redução naquele contrato. Pois, ao mesmo tempo em que vemos dificuldades, inquilinos deixando imóveis, também se percebe a ocupação de outros em determinadas localidades. O que mostra que muitas atividades tendem de fato a terminar se não possuírem ajuda governamental, por exemplo. Porém não são os locadores os obrigados a pagar por isso sozinhos. 

Se as partes não chegam a um consenso sobre os valores que serão aplicados para os aluguéis e para os reajustes, precisam considerar o rompimento contratual e dar a oportunidade de que outras empresas ou pessoas ingressem naqueles imóveis, ou que os locadores assumam o prejuízo de ficarem com seus imóveis fechados. Existe uma questão social relevante, mas não é uma questão simples de se resolver. Inclusive avaliando que outros produtos de outros segmentos sofreram aumentos também, inclusive até maiores. 

O que o locador deve fazer frente ao reajuste do IGP-M?  

O locador deve aplicar o índice, mas, dependendo do contrato e a realidade do mercado, a aplicação desse índice pode ou não ser flexibilizada. Como recomendação, a análise sobre o reajuste do aluguel frente ao cenário atual poderia se dar em duas etapas: 

Primeiro passo: 
O locador, no momento do reajuste, deve aplicar o índice contratual. 

Segundo passo: 
Havendo por parte do locatário um motivo relevante que autorize a rediscussão desse índice, deve haver entre eles uma negociação de forma a justificar uma redução no índice. 

Observação: Essa justificativa não é somente a evidência de que o inquilino está ganhando menos e precisa pagar menos pelo aluguel, e sim analisar a realidade dos preços dos aluguéis daquela região, se diminuíram e o percentual dessa redução.  

Lembrando que para não se aplicar o IGP-M deve-se aplicar a excepcionalidade. 

O índice deve ser aplicado integralmente? 

É fundamental que as partes conversem e busquem um meio termo, avaliem o que cabe na realidade das pessoas envolvidas. Quando essa realidade apontar para a impossibilidade de o inquilino manter o seu negócio ou manter seu apartamento, em detrimento do direito do locador que comprou e investiu em um imóvel, mas que foi razoável e soube ceder à pandemia e aos reajustes, pode ser que essa relação deva encontrar um fim. 

É importante ter uma percepção do cenário jurídico para a negociação entre locador e locatário. 

Por mais que as partes conheçam a situação do mercado relacionado ao imóvel, analisar a situação pelo âmbito dos direitos que estão atrelados a esses contratos, poderá oferecer reflexões para que qualquer uma das partes possa fazer uma negociação mais equilibrada com a realidade que a parte esteja vivenciando e a realidade daquele imóvel que faz parte do contrato de locação.